04/03/2009

Pedaços do que ficou em mim (texto longo s/ grande interesse para os leitores, ainda assim quero guardá-lo aqui)

A minha escola primária foi uma das que fechou há 2 anos na sequência das recentes medidas tomadas no, agora, 1º ciclo. Nestes últimos anos era frequentada por poucos alunos, dada a baixa natalidade de que o país é vítima. O Miguel ainda fez lá o 1º ano e parte do 2º (mudou para a “escola grande” por outras razões), a escola encerrou no ano seguinte.

Tenho pena que tenha fechado por ser a MINHA, mas esta é uma das que não me choca o facto de ter fechado. É uma típica escola de aldeia, com 2 salas, a de cima e a de baixo, assim as distinguíamos pelo desnível que as caracteriza. Nos últimos anos, só a de baixo funcionava com 8/9 alunos das aldeias limítrofes, e na minha opinião não usufruíam de recursos essenciais que, hoje, grande parte das escolas oferece.

Ela fica a mais ou menos 2 kms, numa aldeia vizinha. Fazíamos o caminho a pé todos os dias e atalhávamos, a maior parte das vezes, pelo meio de um pinhal já com um trilho perfeitamente delineado pelas nossas travessias diárias. “Vamos pelo carreiro?” perguntávamos, quase em coro, já com a certeza da resposta.

Achava o caminho muito longo, especialmente a ida ;) Era feliz, ainda que com medo dos meninos grandes e maus que nos intimidavam na escola e no caminho. Os piores eram o “sete” e o “A. Mau”. Era no tempo em que se chumbava e, na mesma classe, as idades misturavam-se.

Chumbava-se e muito! Muitas vezes com razão e outras tantas sem ela. Recordo o meu amigo e conterrâneo R. que chumbou 4 vezes na primeira…depois nem sei o que aconteceu…não sei se saiu da escola…é uma curiosidade que vou investigar. Ele aprendeu tudo o que conseguia aprender e, na época ninguém percebeu que ele tinha, apenas, que passar pela escola para brincar, sociabilizar e mais tarde, talvez, fazer um curso profissional que lhe desse ferramentas para o futuro. Hoje seria considerado um aluno com Necessidades Educativas Especiais. Esta situação deve ter feito a sua auto-estima cair no lodo, talvez. Actualmente é um rapaz puro, feliz, vejo-o sempre de sorriso nos lábios e é muito trabalhador. Acredito que se sinta só e até um pouco diferente dos demais por não ter uma vida “normal” (casado, acho que gostava de ser) o que ainda pode vir a acontecer. Dizia em tempos idos que namorava comigo, mas eu não sabia. Emigrou e, ontem como hoje, não esquece o dia do meu aniversário. Temos menos de um mês de diferença. Dá-me SEMPRE, SEMPRE os parabéns e diz “qualquer dia sou eu”.

Na escola primária eu era boa aluna. A dupla mimika e violeta andava sempre na classe “adiantada”. Às vezes era parva (é melhor não incluí-la, antes que me diga “eu não era assim!”) chamava lesma a um aluno que escrevia muito devagar. Um dia fiquei incumbida de tomar conta dele enquanto terminava os trabalhos. Ele sentado na carteira inclinada (típica das escolas primárias) eu de pé à frente dele, tinha uma cana-da-índia na mão e mandava-o despachar tocando-lhe com ela na cabeça. Não sei se se lembra do episódio, e nunca tive vontade de lhe perguntar, por vergonha.

Lembro-me quando fui para o 1º ano do ciclo (agora 5º) e tive o meu primeiro satisfaz no mínimo chorei muito, desiludida, seguiram-se outros, intercalados de negativas, mas tb muitos satisfaz bem e muito bem.

Lembro-me de mtos episódios bons, outros nem tanto. Não mais me vou esquecer da professora da 2ª classe que nos dava bolachas “baunilha das grandes” (regalia que só tinha ali) e nos levou em excursão a casa dela. Fomos de “camionete” (era assim que dizíamos), brincámos no sótão dela e comemos pudim de caramelo, o meu preferido. Ela era especial. Sabíamos e ainda sabemos (eu e a violeta) o seu enorme nome de cor.

No intervalo da manhã era distribuído leite aquecido numa panela grande. “Quem quer leite?”- gritava o responsável pela distribuição. Fazíamos fila com a caneca na mão. Qd sobrava leite era entregue a um aluno que o levava para casa e tinha a missão de trazer a panela lavada no outro dia. Ficava feliz qd calhava a minha vez. Pegava uma dum lado, outra do outro (violeta ou mana) e lá vínhamos para casa, transportando a panela como se um tesouro se tratasse.

Sexta à tarde as aulas terminavam um pouco mais cedo para limparmos a escola. Varríamos a sala e limpávamos o quadro. Achávamos tudo normal. Era assim…sempre assim…

8 comentários:

Gaivota disse...

Também tenho boas recordações dos meus tempos na escola primária. Apesar de ter estudado numa escola de um subúrbio de Lisboa, o meu professor levava a classe inteira a fazer grandes passeios pelo campo (na altura ainda havia campo perto). O leite já era distribuido em pacotes, não tínhamos de limpar a escola, mas voltávamos para casa numa liberdade total que hoje é impensável, fazendo paragem no parque infantil e nas casas uns dos outros.

Gostei de ler a tua memória. É um tempo muito especial.

Beijos

maria-joão disse...

Eu e quem sabe quantas mais pessoas, encontrei neste texto tantas semelhanças comigo mesma. Tantas que são mesmo quase todas.

Anónimo disse...

as vezes e bom recordar...
tambem tenho desses momentos!!!
bjkas

Anónimo disse...

Outro dia comento, com um comentário maior que o teu post.

VioletaMota disse...

Ler este texto, deu-me um prazer imenso que não sei explicar, ou sei...mas aí teria um comentário maior que o post(utilizando aqui as palavras da Paula).

E então vou limitar-me, por hoje, a dizer que esta noite já fui visitar a nossa escola, em sonhos claro.
Quando acordei senti um grande aperto no peito e uma grande vontade de lá voltar, fazer o quê, não sei, ambas sabemos o quanto está diferente! Mas é algo que quero fazer e muito em breve.

Ps: A panela do leite, trazê-la para casa, como me poderia ter esquecido?! Click!

mimika disse...

É engraçado...pois nós relembramos coisas que já tínhamos esquecido, parece que juntamos peças do puzzle. Isso acontece-me tb quando tu falas desses e doutros tempos...apesar das situações terem sido as mesmas, nós retemos na memória coisas/momentos diferentes.
É por isso é que devemos mesmo registar...continua tb esse teu "projecto" de registo. Por ti, pelo teu filho e tb por mim ;) qd e como te apetecer...

beijinhos

mimika disse...

Tina,

se tiveres intenção de comentar...escreve e publica-se um post "do que ficou em ti".

beijinhos

Anónimo disse...

Memórias soltas:

- Era sempre primavera – os insectos, que faziam aqueles montinhos de terra quando abriam um buraco do chão, eram tantos, tantos e o recreio cheirava tão bem.

- Da panela tenho uma imagem, mas não sei se é minha ou vossa, isto é, não sei se vi ou se me lembro por vocês contarem. Acho que foi na minha 1ª classe que começaram os pacotes de leite. Na minha opinião horríveis, porque eu desconhecia o sabor. Para mim, nessa altura, leite só de vaca e sem transformação.

- O cão que apareceu na escola e depois ficou nosso – o Ribatejo.
- A roda gigante para tirar água do poço.

- O buraco onde eram queimados os papeis à 6ª feira, pela equipa de limpeza do recreio. Haviam 3 equipas, uma para a sala, outra para as casas de banho e outra para o recreio.

- O jogo do galo com pedras e feijões, jogado por cima de riscos que fazíamos no muro na zona dos pilares que tinham a forma quadrada.

- Os jogos e brincadeiras de um modo geral: o elástico, a corda, o 7 e o mau com bonequitos (seriam roubados?) a imitarem uma batalha nos dias de Inverno, no chão todo cheio de lama misturada com saibro.

- A mãe sentada ao meu lado. Esta memória é meio confusa porque não pode ter sido no 1º dia pois eu já tinha uns desenhos feitos (flores e borboletas, pois claro!).

- O meu primeiro conjunto de 5 marcadores. Por fora eram brancos e as cores distinguiam-se pelo fundo - amarelo, azul, preto, vermelho, verde. A dor de alma ao ver o meu colega de carteira pintar com tanta força com eles, que me enfiou os bicos para dentro. Chorei, chorei tanto. Lembro-me deles como se fosse hoje. Não sei se tornei a ter outros durante a primária.

- O primo L..
A monumental queda no pinhal que o levou ao hospital a um internamento de vários dias. Lembro-me desse dia na perfeição. Sei o que almocei, sei o que disse a professora, sei como eram as calças do L., andavam a alcatroar a estrada, tivemos que passar dentro do grão da “Tiamélia”, sei que lhe doía, sei que lhe doía muito. A nossa mana e a G. foram talvez mais adultas que a professora e teriam apenas uns 11 anitos. Levaram-no para casa nos seus braços que encaixaram em forma de cadeira porque ele não conseguia andar.
A ferida com que ficou no peito, os tubos que lhe saiam do nariz para tirar o sangue pisado.
A minha preocupação com ele. Porque não aprendia tão depressa, porque perdeu aqueles dias todos. As vezes que o R. me bateu porque eu ia em socorro do L. O alívio que senti quando fui para o ciclo e o L. ficou mais uma ano na primária. Eu senti que “agora só preciso preocupar-me comigo.”

Que engano… aos 6 anos esse “defeito” era o primeiro sinal daquilo que eu iria ser…
Não posso continuar a escrever mais… era para ser giro contar e lembrar estas coisas e já estou a chorar.